quinta-feira, 1 de outubro de 2015

GERHUP - um caso para refletir

O que é o GERHUP?
É a solução (de software) de gestão de Recursos Humanos para a Administração Pública, adjudicada pelo Instituto de Informática à SAP Portugal; Novabase em 2012, na sequência de um concurso público internacional. De acordo com o portal www.base.gov.pt :
15-06-2012 - Contrato 42_2010 - Solução tecnológica de Gestão de Recursos Humanos... 2.230.500,00 €. Mais detalhe em: www.base.gov.pt/Base/pt/Pesquisa/Contrato?a=526651

No entanto a ideia do GERHUP é muito mais antiga e remonta a uma portaria de 2007 quando foi criada a GERAP - Empresa de Gestão Partilhada de Recursos da Administração Pública, E. P. E.
Nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei 197/99, de 8 de Junho, e da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Criar o Programa de Gestão Partilhada de Recursos da Administração Pública (GeRALL), composto por quatro pilares:
a) Gestão de Recursos Financeiros e Orçamentais em modo partilhado (GeRFiP);
b) Gestão de Recursos Humanos em modo partilhado (GeRHuP);

Este sistema passou a ser gerido pela ESPAP após a sua fundação em 14-jun-2012.

Qual o estado atual do GERHUP?
De acordo com o site da ESPAP este sistema está a gerir hoje, em outubro de 2015 (3 anos depois de adjudicado e 8 anos após idealizado, ainda como piloto) apenas 737 trabalhadores da Administração Pública (outras fontes revelam que são 1.700 trabalhadores):
Os organismos eSPap, ADSE, SSAP e INA já aderiram à solução integrada GeRHuP. Atualmente, são suportados os processos relacionados com o ciclo de vida do trabalhador nas áreas de gestão administrativa de pessoal e vencimentos. Desta forma, é assegurada a gestão de 307 trabalhadores da eSPap, 202 da ADSE, 132 da SSAP e 96 do INA, totalizando um universo de 737 trabalhadores da Administração Pública.

Quanto já se investiu no GERHUP?
Questionadas informalmente várias pessoas e entidades, obtêm-se respostas diversas, desde "não se gastou nada" até "já se gastaram 40 milhões".
De acordo com o portal  www.base.gov.pt, fazendo uma simples pesquisa por GERHUP, obtemos valores de adjudicações que totalizam 6,5 milhões de euros.
Não estão incluídos neste montante os valores de salários e instalações da equipa técnica e de gestão afeta a este projeto, pelo menos, nos últimos 3 anos.

Qual foi o plano de projeto para o GERHUP?
De acordo com resolução de 2012 que não foi cumprida, o GERHUP deveria ter concluído a sua expansão a todos os organismos púbicos até final de 2014.

Resolução do Conselho de Ministros n.º 12/2012
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 46/2011, de 14 de novembro, constituiu o Grupo de Projeto para as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), doravante abreviadamente designado por GPTIC.
….
Prazo: A medida será coordenada pela Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I. P. (ESPAP, I. P.), devendo garantir-se que o GeRFip será implementado em 50 % dos organismos públicos durante o ano de 2012 e estendido a todos os organismos públicos até final de 2013; o GeRHuP deverá concluir a sua expansão a todos os organismos púbicos até final de 2014.

Então como é que se gerem atualmente os Recursos Humanos na Administração Pública?
A Gestão dos Recursos Humanos da Administração Pública é atualmente processada nos vários organismos, com alguma interoperabilidade entre sistemas, com um grau de qualidade satisfatório, embora com uma utilização heterogénea. Há quem consiga ir até à avaliação de desempenho e SIADAP 123 e há outros, menos ambiciosos, que se ficam pelo básico, assiduidade e vencimentos mas, julgo que alguma formação, resolveria este assunto.
Existe uma aplicação desenvolvida nos anos 80, denominada SRH que tem vido a ser remodelada por uma pequena equipa de desenvolvimento, na ESPAP, que precisa de alguma corecão e atualização tecnológica, e que parece ser, de facto, a solução utilizada por uma grande maioria dos organismos públicos para calcular, todos os meses, sem falhas, os vencimentos dos seus funcionários.
Outros organismos utilizam, com sucesso, software do mercado como por exemplo o da Quidgest entre outros.
O setor da Saúde utiliza um software denominado RHV desenvolvido e mantido internamente pelos SPMS (antigo IGIF).
A Administração Local utiliza essencialmente software das empresas portuguesas Medidata e AIRC.
As escolas secundárias do Ministério da Educação utilizam uma aplicação da empresa de Leiria, a JPM Abreu.
Só uns quantos organismos, digamos menos nacionalistas e supostamente mais "ricos", é que se aventuram pelo software alemão SAP, americano Oracle ou espanhol GIAF, com elevados custos de manutenção e desempenho sofrível.

Porque é que o GERHUP não resultou?
A ideia de um sistema único central para esta finalidade está errada. É como se tentasse colocar um comboio a voar. Mesmo que seja SIEMENS! Por muitos milhões que se invista, nesta teimosia, acredito que não vai resultar, essencialmente porque:
- A complexidade e heterogeneidade das diversas entidades públicas, carreiras, funções bem como as evoluções legislativas constantes, impedem a implementação com sucesso deste tipo de soluções pouco flexíveis e ágeis e longe das especificidades de cada cliente.
- São lentos os processos de desenvolvimento e manutenção, dadas as características da solução escolhida, apesar do brand que tem e dos preços astronómicos de licenciamento e suporte.
- O desenvolvimento é efetuado pela mesma entidade que o instala, utiliza e fiscaliza.
- Os vários sistemas existentes funcionam e há uma natural resistência à mudança.
- É um caso semelhante ao GERFIP (contabilidade pública), com o mesmo conceito de "sistema único central" de origem estrangeira, onde já se investiram também alguns milhões (7,25 M€  de acordo com o portal www.base.gov.pt, fora salários e outros custos) nos últimos 10 anos e que continua a ter muitas lacunas (nomeadamente ao nível patrimonial e de gestão de ativos) desadequação ao uso e atraso no cumprimento da lei na opinião de alguns dos utilizadores e, acima de tudo, a não ser usado por quase nenhuma das entidades acima referidas (Saúde, Autarquias, Educação, ...)

Qual o plano de saída para esta situação?
Pelo acima exposto o bom senso apontaria para que se travasse imediatamente este processo, que atravessou diversos governos e legislaturas, se definissem normas de interoperabilidade entre os vários sistemas, se atualizassem tecnologicamente ou substituíssem os mais obsoletos, se desse vantagem ao talento e à tecnologia nacional e assim aumentar a eficiência e o reporting do que atualmente existe com custos astronomicamente mais baixos!
Dois bons exemplos são o caso das faturas e o da prescrição eletrónica. Cada empresa ou entidade utiliza a aplicação que quiser, desde que certificada, fazendo o reporting em formato normalizado à entidade reguladora.

Mas... parece que não!

Pelo disposto no recente Diário da República, 1.ª série -- N.º 186 -- 23 de setembro de 2015
Resolução do Conselho de Ministros n.º 82/2015 onde se lê:
...Gestão de Recursos Humanos em modo Partilhado (GeRHuP) nos órgãos e serviços do Ministério da Educação e Ciência, até ao montante global de 9 220 034,36 EUR, sendo 2 219 680,10 EUR referentes à aquisição de licenças, e 7 000 354,26 EUR relativos à implementação dos roll outs, a que acresce IVA à taxa legal em vigor...


O Estado parece disposto a investir mais uns milhões de euros nesta aventura falhada. Por agora são mais 9,22 milhões só para o Ministério da Educação mas... se o plano se estender aos restantes 12 ministérios estaremos a apontar para valores na ordem dos (9x12) 100 milhões! em que mais de 20 milhões vão para uma empresa alemã, para pagar algo que está perfeitamente ao nosso alcance desenvolver!

Quem pode liderar uma outra saída?
A ESPAP. Pedindo já a reconversão do orçamento de 9,22 milhões aprovado para ser aplicado num novo projeto de atualização tecnológica, consulta ao mercado, regulação, reporting e visualização de indicadores, otimizando as soluções em funcionamento atualmente.
A missão do Estado é controlar e gerir e motivar os seus recursos humanos de forma eficiente, soberana e ao melhor custo.
Importar software e desenvolver sistemas de informação parece ser mais uma vocação de algumas empresas.

Quais as entidades reguladoras?
A Provedoria Geral da República parece ser o órgão competente para auditar este processo do ponto de vista jurídico e administrativo e a Inspeção Geral de Finanças o órgão capaz de uma investigação mais técnica. Talvez a Autoridade da Concorrência também pudesse ter uma palavra a dizer nesta matéria.


Portugal Pode Prosperar!



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