segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Observatório da Soberania

Compete ao Presidente da República garantir a independência nacional. Eu diria que a palavra mais adequada será soberania pois, a independência, numa lógica económica, ambiental e até militar, tanto a nível europeu como até mundial, há muito que está comprometida. 

Sem essa dita soberania o Presidente não tem razão de existir.

A lógica de que um país soberano tem a ver com um território, uma língua, uma bandeira e um hino está cada vez mais ultrapassada. O nosso território deixou de ter fronteiras na Europa e é relativamente fácil a mobilidade de qualquer cidadão normal, para qualquer lugar do planeta. O inglês tornou-se língua universal, devido essencialmente aos computadores. Com conhecimentos básicos, pode comunicar-se, de alguma forma, muito rapidamente com quase toda a população mundial. E, o hino, só é conhecido e só se toca, quase apenas, em cerimonias oficiais do Estado e em eventos desportivos internacionais.

Então o que é, afinal, a soberania?
É basicamente uma forma de organização política, económica e cultural de uma dada região.

Quando falamos de Portugal falamos essencialmente de um governo com as suas políticas e leis, de uma economia que vende produtos e serviços a nível global, em qualquer moeda, pagando localmente os respetivos salários e impostos, e de uma cultura latina muito específica com hábitos e crenças seculares, onde se incluem temas que vão desde a gastronomia à arte, da língua à religião, ou do desporto ao comportamento social.
A soberania de Portugal e, de algum modo, a qualidade de vida dos portugueses, está pois dependente desses três vetores: Uma organização política segura, visionária e credível, uma economia rica e sustentável e uma cultura viva e promotora do bem estar e felicidade dos cidadãos.

Quais as principais forças e fraquezas da nossa soberania que merecem ser observadas? 

Dívidas
Um país que gasta mais do que ganha, que importa mais do que exporta, terá o mesmo destino que uma família ou uma qualquer empresa ou organização: a falência! E não há soberania que resista a uma dependência financeira, qualquer que ela seja. Por isso a avaliação deste importante indicador deveria estar presente na ordem do dia, de um país e de um Presidente que se queira soberano. 
Questões como por exemplo a regulação da atividade bancária, a movimentação de capitais privados, os processos de venda do nosso património ou a percentagem de Compras do Estado ao Estrangeiro (podíamos chamar-lhe índice CEE) têm que ser continuamente monitorizadas.
Um governo que não deve, não teme. Se deve, só consegue a sua soberania pela força e essa não é a melhor forma de soberania em regimes democráticos. E a ditadura, já experimentámos e não resultou bem.

Competitividade
Num mercado global cada vez mais aberto e inovador é vital saber competir de uma forma ganhadora, apresentando soluções de valor diferenciadoras. 
O índice de competitividade nacional tem vido a ser monitorizado e tem apresentado melhorias nos últimos anos. É de manter essa observação mas, sobretudo, dotar as empresas e organizações nacionais de mecanismos de dinamização dessa competitividade. A inteligência económica passa por algum protecionismo cauteloso, nas compras, no mínimo assegurar que havendo produto nacional de qualidade semelhante, se evita a compra externa e preferir o que é produzido pelas nossas empresas. Espera-se delas um posicionamento competitivo não só a nível nacional mas, sobretudo, pela conquista de novos mercados globais. 

Conhecimento, inovação e mérito
No tempo dos descobrimentos conseguimos ter um avanço tecnológico no fabrico de barcos e de canhões que nos deu uma vantagem militar, comercial e depois económica durante várias décadas. Qual a área onde hoje nos podemos posicionar para afirmarmos alguma vantagem diferenciadora a nível global? No software? Na biologia marinha? No turismo? No desporto? No calçado? Na produção audio-visual?
De que forma premiamos a apoiamos os nossos talentos que se distinguem nestas e noutras áreas? Como formamos e certificamos as nossas competências? Como são nomeados os gestores e líderes que nos governam?

Notoriedade e Relações Públicas Internacionais
O marketing de uma nação faz-se em múltiplas vertentes, desde as visitas de estado à qualidade do turismo, desde o futebol à celebração de acordos comerciais. Um país que seja falado, preferencialmente por boas razões, pelos meios de comunicação e líderes de opinião de todo o mundo é tendencialmente mais respeitado e soberano. 

Segurança
Para além das questões militares e policiais mais tradicionais, a informação é hoje um dos ativos mais importantes para garantir a segurança de qualquer nação soberana. Um país compromete gravemente a sua soberania se deixa nas mãos alheias o arquivo, o controle e a comunicação da sua informação. Todos sabemos que as grandes corporações tecnológicas como a Google, a Microsoft ou a Apple é que controlam grande parte dessa informação. Monitorizar esta dependência, promover alternativas nacionais e desenvolver planos de contingência é fundamental para uma soberania que se pretenda saudável.

Identidade cultural
Ouvi hoje nas notícias que "mandar piropos" pode dar até 3 anos de cadeia e que todos os partidos apoiaram esta nova lei proposta pelo PSD. Não haverá mais nada que fazer na Assembleia da República? O desrespeito pelo próximo sempre foi um crime. Não concordo nada com comportamentos sociais de falta de respeito, como por exemplo passar à frente em filas de trânsito mas parece-me que, fazendo parte da nossa cultura, algumas coisas como o piropo do trolha (dentro dos limites do bom senso), o pregão das cautelas de lotaria ou do mercado do bolhão deviam ser preservadas e não proibidas por lei. Este é apenas um exemplo de como se podem desenvolver ataques a uma soberania pela sua identidade cultural. Leis como a tolerância 0 (zero) à taxa de álcool ou o fim do feriado do Carnaval, acabam por nunca serem cumpridas além de provocarem um sentimento de revolta social e uma perca de energia que devia ser canalizada para outros assuntos mais positivos, como por exemplo colocar o fado e o cantar alentejano como património da humanidade.

Território e Património
Claro que é também fundamental conhecer que percentagem do território, imobiliário e património que é propriedade nacional e qual a sua evolução no tempo, para conhecermos as tendências da nossa soberania. De que forma conseguimos ir vendendo o nosso território aos estrangeiros, continuando a ser soberanos na governação do nosso país? Pela lei? Pela força? Pela história?

Corrupção e Economia Paralela
Quando se permitem negócios de montantes astronómicos, com entidades estrangeiras, à margem da lei e das entidades reguladoras e fiscalizadoras, sob a capa do abuso de poder, da manipulação da comunicação ou, apenas, abusando da atitude pacífica de um povo ainda confiante nas suas instituições, corroem-se dramaticamente as bases de qualquer soberania. Por muito sólidas que sejam a economia, a política e a cultura, se continuarem a ser permitidas, por exemplo, adjudicações diretas de software básico de gestão, sem concurso, (ou com regras tendenciosas) a multinacionais estrangeiras, de produtos e serviços perfeitamente ao nosso alcance, a nossa soberania não irá longe.
O fenómeno da corrupção está muito ligado ao do servilismo. Alguém acima mandou fazer e fez-se, mesmo contra tudo o que é bom senso e de lei. A brandura punitiva do nosso sistema judicial e até da nossa sociedade tolerante, facilita também este tipo de disfunções da nossa soberania que convém acompanhar.

Auto estima
Uma população será mais soberana se os indivíduos que a constituem gostarem de si e do grupo social a que pertencem. Todo o tipo de ações que promovam a auto estima, a confiança mútua e a colaboração são ingredientes basilares de progresso  e de uma boa soberania.

Acho que um Observatório que meça e divulgue estes e outros indicadores correlacionados com este tema, como a emigração de talentos ou o nível de apoio e a sustentabilidade da segurança social, é fundamental para assegurar a legitimidade dos órgãos de soberania, nomeadamente a do Presidente da República.

E você?


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